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A mostrar mensagens de abril, 2020

Um Dia Inesquecível!

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ERAM para aí umas sete da manhã daquela Quinta-feira, quando o meu pai entrou no meu quarto e veio acordar-me, antecipando-se ao despertador. Ele estava excitadíssimo, com o rádio do quarto dele com o volume mais alto que o habitual, enquanto ia comentando: - Passa-se qualquer coisa... de dez em dez minutos, estão a dar comunicados de um comando das forças armadas, a dizer para nos mantermos calmos e não sairmos de casa..., dizia-me ele nervoso, ainda em traje de pijama e a passar a máquina de barbear de uma mão para outra, enquanto que do seu quarto vinham os sons pouco comuns de trechos de música clássica, sem interrupções de publicidade, à mistura com algumas marchas militares. - Desta vez é que é! Exclamei eu, sentado na cama, a fazer tentativas para espantar aquele sono pegajoso. - Afinal aquilo em 15 de Março, sempre foi um ensaio! Levantei-me e fui até ao quarto do meu pai, à espera de mais novidades da Rádio Clube Português. - Aqui posto de comando do Movimento das F

Recordações dos Anos de Chumbo

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Tempos de escola primária, nos primórdios dos anos 50 do século passado. Saía de casa o mais cedo que pudesse, para ganhar tempo para a brincadeira no pátio do recreio, antes que se ouvisse o badalo a chamar os meninos à sala de aula. Sim, apenas os meninos, porque naquele tempo, nas escolas primárias (e também noutros estabelecimentos de ensino), não havia turmas mistas, nem turmas para meninos e turmas para meninas. Era muito pior. Havia uma escola para meninos e uma escola para meninas, separadas por uma alta vedação de rede e com horários de recreio diferentes, por causa das tosses. Mesmo assim, ai de quem fosse apanhado a espreitar as meninas ou, não sendo irmãos, a fazer-lhes esperas à saída das aulas...     Nas salas de aula, por cima do quadro de ardósia, havia um crucifixo, com as fotografias vigilantes do Oliveira Salazar de um lado, e do Craveiro Lopes do outro. Na parede ao lado estavam pendurados os mapas de Portugal e das colónias. Na primeira classe levei duas o

Conto Negro e Curto - O Segredo

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O Bruno Pandemónio, homem de idade incerta, tinha sido abandonado na roda dos enjeitados da Misericórdia. Tinha pouco de pitoresco. Deserdado de tudo, o apelido advinha-lhe da sua irreverência e da tendência para gerar conflitos incontroláveis, a partir de situações minúsculas. Dormia no portal de Santo Estevão, cirandava pelo empedrado húmido e escorregadio das vielas e recantos de Alfama, passeando os andrajos e a miséria, misturados com muita revolta, insolência e agressividade provocatória. Ninguém lhe dava atenção nem trabalho, pedia esmola aqui e ali, disputava nos becos os restos de comida com os cães, ou roubava o que podia, fosse nas vendas ou nos mercados. As caixas das esmolas das igrejas eram a sua preferência. À custa disso levava pancada e passava mais tempo nas enxovias da guarda do que em liberdade. Falava pouco mas quando por alguma razão conseguia que lhe dessem atenção, costumava berrar a plenos pulmões, aquela frase repetida vezes sem conta:  - Vocês só se liv